4ªf, bolo-rei a acompanhar uma Pêra do Edgar, sobre o Rei da Guitarra Portuguesa: CARLOS PAREDES

MOVIMENTOS PERPÉTUOS - CINE-TRIBUTO A CARLOS PAREDES - 4ªF - 21H30 - SEDE - ENTRADA LIVRE

Documentário em 17 movimentos, em que os testemunhos e a guitarra definem o génio, a bravura e a modéstia de Carlos Paredes, Movimentos Perpétuos – estabelece um diálogo entre uma guitarra e uma câmara de Super8, numa estética que evoca a memória dos velhos filmes de família, plena de intimidade, revelada na partilha de pequenas histórias da vida. O concerto de Carlos Paredes no Auditório Carlos Alberto, no Porto, em 1984, é o ponto de partida para o desenrolar de histórias de prisão, resistência, sucessos e amadorismo, relatos marcados pela simplicidade e pela paixão.

PRÉMIOS
IndieLisboa, Portugal (2006) – Melhor Longa-metragem Portuguesa, Melhor Fotografia para Longa-metragem Portuguesa e Prémio do Público
Famafest, Portugal (2006) – Grande Prémio da Juventude




NOTA DE INTENÇÕES
A primeira imagem: um daqueles prodigiosos polvos dos desenhos animados a executar uma música apenas possível de ser tocada com múltiplos tentáculos. A primeira vez. Foi na primeira Festa do Avante. Lamento, mas essas memórias foram soterradas por outras mais extravagantes.

Só me recordo dos contrastes flagrantes: uma concentração inédita de hippies e a intempestiva actuação dos Area, aos quais fui mais tarde buscar o LP Arbeit Macht Frei para o título e ponto de partida do filme O Trabalho Liberta?.

Mais tarde, vi-o tantas vezes em tantas festas, comícios e sessões de esclarecimento que, quando chegaram os anos 80, já era o fastio. Inflação total: aproveitamento constante das músicas de Paredes. Propaganda política e a utilização até à exaustão de trechos seus nas bandas-sonoras de documentários e ficções dos pobrezinhos. Sobrava o respeito pelo talento desmedido. Mas nunca, jamais em tempo algum, faria um filme com música do gigante.


Flashforward.

Um século passa. Convidaram-me para participar nos Movimentos Perpétuos de homenagem a Carlos Paredes. A minha relutância não estava vencida e recusei-me a utilizar a música do «nosso guitarrista». Usei uma maquete dos Dead Combo como banda-sonora de Guitarra (Com Gente Lá Dentro).

O filme, inspirado no western-fado, consistia num tributo autónomo. A voz do guitarrista Charlie Walls (Paredes, antes do concerto com Charlie Haden assim se apelidou) serviu de narrador de outros tempos. Abria e fechava com uma cine-moldura de imagens de Paredes (que registei nos idos 90), nos bastidores de um espectáculo dos Madredeus no qual ele era convidado.

Edgar Pêra



Apaixonado e lírico documentário dividido em 17 partes que enquadram a vida e obra de Carlos Paredes. Esta divisão empresta clareza na aproximação do filme ao tema. Mas Edgar Pêra mantém-se também fiel à sua estética de manipulação da imagem e do som. Uma pesquisa formal que pode ser resumida neste axioma: mexer na matéria audiovisual como coisa concreta e abstracta à qual pode ser dada expressividade. Não é um processo racional ou até racionalizável, nem na obra de Brakhage nem na do cineasta português. O cinema de Pêra não tem a limpidez e a nudez da música de Paredes, mas ambas têm essa intuição artística. E «Movimentos Perpétuos» contém momentos da mais pura simbiose (e do mais fértil diálogo) entre a fluência das notas tocadas pelo músico e o movimento das imagens criadas pelo realizador.

Sérgio Dias Branco


O concerto que o guitarrista deu no Auditório Carlos Alberto, no Porto, em 1984 – onde antecedia cada interpretação com longas explicações sobre o seu método de trabalho – é o ponto de partida para o desenrolar de histórias de prisão, resistência, sucessos e amadorismo, todas elas relatos marcados pela simplicidade e pela paixão.Imagens, sons de arquivo e depoimentos (de Rui Vieira Nery, José Jorge Letria, Paulo Rocha, Malangatana e José Carlos Vasconcelos), contextualizam a importância do músico, não se sobrepondo nunca à própria voz de Paredes. Obviamente que falando-se de Edgar Pêra, tudo isto aparece fragmentado, estilhaçado, multiplicado e reinventado a seu bel-prazer.Como quase sempre faz, o cineasta constrói um “mundo paralelo”, onde o passado e o presente se confundem, como se a portugalidade indefinível que constitui a essência da música de Paredes continuasse presente e não nos tivesse abandonado.Sobre este filme-tributo, confessa-se surpreendido pelas afinidades que encontrou com o músico. “Sinto-me pouco à vontade com ícones como o Carlos Paredes. Não por não gostar do trabalho deles – exactamente por gostar e achar que é uma armadilha prestar homenagens. Mas há ali muitas frases que subscrevo… Ele e os que falam dele levantam questões que afectam qualquer pessoa que tenha um percurso independente em Portugal – que conduz na maior parte das vezes a uma marginalização”, explicou numa entrevista concedida ao ‘Público’. Para além de uma tocante homenagem ao músico, e à pessoa que se escondia por detrás dele, este é também o filme mais bem conseguido e acessível de Edgar Pêra. De resto, o cineasta reconheceu, na mesma entrevista, que a linguagem que habitualmente usa lhe tem tolhido os movimentos. “A realidade é que para fazer ficção em Portugal é complicadíssimo convencer um produtor a investir num filme. As pessoas não me dão dinheiro porque devem ter medo que eu faça uma coisa esquisita. Ora, quando cheguei a 2001 e vi ‘A Janela’, ‘O Homem-Teatro’ [documentário sobre o encenador e actor António Pedro] e ‘Oito, Oito’ a estrear, tudo no mesmo ano, apercebi-me de que podia lidar com matéria ficcional linear com destreza”, diz, acrescentando “mas tenho esbarrado naquela coisa chamada júris…”.Neste momento, está a ultimar “Rio Turvo”, adaptação de um conto de Aquilino Ribeiro, filmado em regime de produção independente, sem subsídio.

(daqui)





Realização: Edgar Pêra
Argumento: Edgar Pêra
Produtor: João Pinto Sousa
Elenco:
Edgar Pêra
Carlos Paredes
Luísa Amaro
Fernando Alvim
Origem: Portugal
Ano: 2006
Duração: 70’

2 prendas de Natal - cinema português para crianças em Estói, cinema português para adultos no IPJ

DIA 17 - 15H - CINE-TEATRO DE ESTÓI - ENTRADA LIVRE
UM GATO SEM NOME E OUTROS 6 FILMES, 6 realizadores, Portugal, 59'
Co-organização: Junta de Freguesia de Estói / CCF

DIA 19 - 21H30 - IPJ - ENTRADA LIVRE
UM FILME PORTUGUÊS, 6 realizadores, Portugal, 2011, 104’- PRESENÇA DE 4 REALIZADORES
Co-organização: CIAC / CCF


DIA 17

"Um gato sem nome e outros 6 filmes" transporta os mais jovens para uma viagem no cinema de animação português. 7 curtas-metragens de 6 realizadores com filmes de um leque variado de técnicas, grafismo, histórias e sobretudo muita fantasia.

UM GATO SEM NOME
Carlos Cruz, 2009, 15’ ( Técnica - 2D computer)

FICHA TÉCNICA
Realizador: Carlos Cruz
Argumento: adaptação do livro infantil " Um gato sem nome" de Natércia Rocha
Criação Artística: Carlos Cruz
Storyboard: Jorge Barros
Animação: Charlie Blue; Pedro Tchen; Lu Qifeng; Yu Yonghai; Yu Yongbin; Yu Yongsheng
Voz: Araby McClintock; André Kong; David Marc Bernfeld; Catarina Cruz
Som: Pim Pam Pum Estúdios
Sonoplastia: David Neutel
Música: Nik Phelps
Produtor: António C. Valente
Produção: Cine-Clube de Avanca
Co-Produção: Filmógrafo, Animegas
Apoios: MC/ ICA, RTP-Rádio e Televisão de Portugal

SINOPSE
Esta é a história da Menina Cláudia que, na véspera do seu aniversário, formula um desejo: gostava de ser mosca para poder ouvir as conversas da sua família e assim saber quais os presentes que lhe vão dar. E qual não é o seu espanto quando se apercebe que não se transformou em mosca mas que consegue ouvir o pensamento das pessoas. E ela, que só queria uma boneca, fica assim a saber que toda a sua família está a pensar em lhe dar animais de estimação, em vez da desejada boneca o que a deixa em estado de pânico. É por isso que esta é também a história da Tartaruga Zoraida, do Peixe Onix e do canário Amarelinho.

PRÉMIOS E PARTICIPAÇÃO EM FESTIVAIS INTERNACIONAIS:
Prémio Competição Avanca e Menção Honrosa Prémio Estreia Mundial - AVANCA 2009 - Encontros Internacionais de Cinema, TV, Vídeo e Multimédia - (Portugal) | 22-26/07/2009
Prémio Animação - CUBANIMA 2010 - Festival Int.l de animación para los ninez y la adolescencia, (Cuba) | 01-05/06/2010
Finalista no 16th Shanghai TV Festival - (China) | 07-11/06/2010
Nomeado para : Prix Jeunesse Iberoamericano 2009 (Brasil), Krok (Úcrania), etc.



LIVING IN THE TREES
Vítor Lopes, 2008, 6.5‘

FICHA TÉCNICA
Argumento, realização, produção: Vitor Lopes
Animação: Vitor Lopes
Música: Jack Jaques
Produção: Filmógrafo

SINOPSE
Quando não há paciência para ouvir os outros, tudo pode acontecer.

PRÉMIOS E PARTICIPAÇÃO EM FESTIVAIS INTERNACIONAIS:
Menção Especial - CARTOONS ON THE BAY – Pulcinella Awards (Itália)
Menção Honrosa - Porto 7-Festival Internacional de Curtas-metragens do Porto (Portugal)
Prémio Movile - 6th Naoussa International Film Festival (Grécia)
Prémio ENCONTARTE - AMARES 2009 (Portugal)
Nomeado para : Rimouski (Canadá), Riviera Maya (México), Bourg-en-Bresse (França), Belgrade (Sérvia), AnimFest 09 (Grécia), Giffoni, Rimini (Itália), Skopje (Macedónia), Cine a la Calle (Colômbia), Caminhos (Portugal), THE PALACE (Bulgária), etc.



O RELÓGIO DE TOMÁS
Cláudio Sá, 2010, 8’

FICHA TÉCNICA
Argumento, realizador: Cláudio Sá
Animação: Cláudio Sá; João Rodrigues
Voz: Manuel Silva; Sílvia Sá
Edição: Cláudio Sá
Música: NAD, Art of Ghetto
Produtor: António C. Valente
Produção: Filmógrafo
Co-Produção: Cineclube de Avanca

SINOPSE
O tempo não volta atrás, e bem lá atrás, ficam momentos aos quais não damos o devido valor.
Com a chegada de um relógio mágico, Tomás vai ter o privilégio de "mandar no tempo".
Ou irá este ensiná-lo a viver?
PRÉMIOS E PARTICIPAÇÃO EM FESTIVAIS INTERNACIONAIS:
Prémio 1º Lugar - Festival de Cinema Independente ON'CINE, (Portugal) | 05-06/08/2010
Nomeado para : ANIMAMUNDI (Brasil), ANONIMUL (Roménia), Rimouski (Canadá), Schlingel, Detmold (Alemanha), Ourense, Elche (Espanha), Faial, Caminhos, Porto7 (Portugal), Naoussa (Grécia), ZLÍN (Rep. Checa), etc.


ZÉ E O PINGUIM
Francisco Lança, 2003, 10’

FICHA TÉCNICA
Realização: Francisco Lança
Argumento: Francisco Lança and Joana Imaginário
Director de Produção: António Costa Valente
Animação: Francisco Lança and Vítor Lopes
Pintura: António Almeida, Carlos Silva and João Dias
Montagem: Carlos Silva
Director de Som: Fernando Rocha
Música: António Vitorino D'Almeida
Produção: Cine Clube de Avanca
Apoio: MC/ICAM, RTP - Rádio e Televisão de Portugal

SINOPSE
O Zé é uma criança que vive atormentada pelas contínuas discussões dos pais, tendo como único amigo um pinguim de pelúcia que ganha vida quando estão sozinhos.

PRÉMIOS E PARTICIPAÇÃO EM FESTIVAIS INTERNACIONAIS:
Prémio Competição Avanca - AVANCA 2003-Encontros Internacionais de Cinema, Televisão, Vídeo e Multimédia (Portugal) | 23-27/07/2003
1º Prémio -3º Festival de Vídeo de Corroios - VIDEOCOR 2003 (Portugal) | 14-22/11/2003
Nomeado para : Annecy, Amiens (França), Auburn (Austrália), Asiana (Coreia), Tessaloniki (Grécia), Viña del Mar (Chile), Ourense, Huesca (Espanha), FIKE, Caminhos, Algarve (Portugal), Bologna (Italia), Cairo (Egipto), BIMINI (Letónia), Sergipe (Brasil), ZLÍN (Rep. Checa), Istambul (Turquia), Roshd (Irão), Rimouski (Canada), Durban (África do Sul), etc.


HISTÓRIAS DESENCANTADAS
Vítor Lopes, 2000, 8’

FICHA TÉCNICA
Realização: Vítor Lopes
Director de Produção: António Costa Valente
Animação: Vítor Lopes
Som e Montagem: Carlos Silva
Música: Neo Felgar / F-Acts
Produção: Cine Clube de Avanca
Apoio: MC/ICAM, RTP - Rádio e Televisão de Portugal

SINOPSE
Entre personagens e histórias de televisão, o último olhar do nosso herói, antes de adormecer vai para os velhos livros na estante e as suas tradicionais histórias encantadas.

PRÉMIOS E PARTICIPAÇÃO EM FESTIVAIS INTERNACIONAIS:
1ºPrémio Cinema de Animação - "33rd Melbourne Int'l Film & Video Festival - Australia | 2000"
Prémio Especial do Júri - TSTTT Int'l Film Festival (Republica Checa) | 2000
Prémio de Melhor Argumento - AVANCA 2000 (Portugal)
Prémio Melhor Animação - Festival de Cinema de Arouca (Portugal) | 12/2005


SUPER CARICAS
Cláudio Jordão, 2003, 6’

FICHA TÉCNICA
Argumento, realização, produção: Cláudio Jordão
Vozes: Catarina Jacome, Fulvia Almeida
Animação e Montagem: Cláudio Jordão
Música: João Paulo Nunes

SINOPSE
Um curioso jogo entre a realidade e a ficção, onde os jogos de hoje se misturam com os de outros tempos, e onde o único limite é a imaginação de uma criança que se perde num universo paralelo...pelo menos até à hora de jantar!


DÁ-ME LUZ
Sérgio Nogueira, 2002, 3 min

FICHA TÉCNICA
Realização: Sérgio Nogueira
Argumento: Cristina Sopas, Sérgio Nogueira
Director de Produção: António Costa Valente
Animação: Sérgio Nogueira, Vítor Lopes, João Dias
Pintura: Pedro Monteiro, Pedro Rocha, Rui Carvalho
Montagem: Carlos Silva
Som: Cine Clube de Avanca, Mastermix, Aurastudio
Música: Carlos Pascoinho, Pedro Janela
Produção: Cine-Clube de Avanca
Apoios: MC/ ICA, RTP-Rádio e Televisão de Portugal

SINOPSE
É noite numa imensa praia deserta. Um homem com um profundo buraco negro no peito torna-se no alvo de um fogoso pirilampo.

PRÉMIOS E PARTICIPAÇÃO EM FESTIVAIS INTERNACIONAIS:
Prémio Europeu - "Best work Section Pax" Massimo Troisi 2003 (Itália)
Prémio Menção Honrosa - 1º Festival Júlio de Matos 2006
Nomeado para : Figueira da Foz, Algarve, Caminhos (Portugal), Lleida, Huesca, Elche (Espanha), Lille, Amiens (França), Cairo (Egipto), Thai (Tailândia), Asolo, Visionaria, Bologna (Itália), Tessaloniki, Larissa (Grécia), Viña del Mar (Chile), Dakino (Roménia), Cinénygma (Luxembourg), Sergipe (Brasil), Szolnok (Hungria), Istanbul, Izmir (Turquia).



DIA 19


UM FILME PORTUGUÊS
Levi Martins, Vitor Alves, Miguel Cipriano, Jorge Jácome, Vanessa Sousa Dias e Carlos Pereira, Portugal, 2011, 104’

Seis olhares sobre um país, e seu lugar no mundo, através do cinema.

Uma viagem pela estrada fora, por entre novas fronteiras, à procura de imagens, sons e histórias. Um filme falado, narrado por diferentes gerações, tentando descodificar o ontem, hoje e amanhã do cinema feito em Portugal. Uma reflexão sobre as actuais inquietações ligadas aos sistemas estético, dramático e de produção dos filmes, voltando a uma antiga pergunta: o que é, afinal, o cinema?


Documentário composto por seis segmentos de 17':

- A Constante, Levi Martins
- Os Náufragos, Vítor Alves
- Paisagem Identidade, Miguel Cipriano
- Vaivém, Jorge Jácome
- Minucia Lunaris, Vanessa Sousa Dias
- O Tempo dos Outros, Carlos Pereira

Imagem: Marta Simões, Pedro Sousa, André Dinis Carrilho, Carlos Pereira
Som: Levi Martins, Jorge Jácome, Laura Brasil, Miguel Cipriano, Ana Isabel Costa
Montagem: Beatriz Tomaz, Levi Martins, Vitor Alves, Miguel Cipriano, Jorge Jácome, Vanessa Sousa Dias, Ana Isabel Costa, Carlos Pereira
Música: Levi Martins, Luis Giestas, Eduardo Dias Martins
Participantes (Entrevistados): Luís Miguel Oliveira, Graça Castanheira, António-Pedro Vasconcelos, Luís Urbano, Manuel Mozos, Paulo Rocha, Jorge Silva Meio, Joaquim Sapinho, Saguenail e Regina Guimarães, João Canijo, João Botelho, João Pedro Rodrigues, João Rui Guerra da Mata, Possidónio Cachapa, Miguel Valverde, Marco Martins, Manuela Viegas, Rita Azevedo Gomes, João Lopes, Cláudia Varejão, João Salaviza e Gabriel Abrantes.

4ªf, Sede, 21h30, à borla - a primeira longa-metragem do Edgar. E que Pêra!

Dia 14
A JANELA, 2001, 104’

NOTA DE INTENÇÕES
(O phylm ele mesmo, propriamente dito)

Primeira obra do Senhor Ego em dimensão standard «A Janela (Maryalva Mix)» é uma pelycula de longa metragem de 104 minutos sonora e muda, colorida e a preto e branco, rodada em filme super-8, 16mm, 35mm (sobretudo) e em vídeo mini-dv, com cópia final em 35mm Dolby® estéreo.

Trata-se também de um jogo, o jogo do Kem é o antónyo?™, um drama montado sobre uma narrativa não-linear e não-elementar - montagem arbitrária mas não-aleatória - desenhado na forma de um eskyzo-fado que aborda o destino de um arcaico pseudo-eskyzo-fadista da Bica.

Trata-se de uma obra que pretende 'recuperar' uma tradição burlesca e excentricionista(!): os actores falantes improvisaram monólogos, os actores mudos desenvolveram arquétipos de personagens antoninos - incluindo algumas tiradas sobre peixes.

A dimensão referencial, multi-cultural e 'kosmopolítico', pretende sublinhar o carácter popular de um certo lisboeta português de uma época para quem, apesar de tudo isso, "a Bica é um mundo!" e o Tejo a sua fronteira (ou vice versa).

O tipo de uso e a distorção da iconografia, gráfica, visual e sonora, é usada como 'imagens do pensamento/realidade', sendo a ideia de frequência/interferência rádio (e neuro-bioquímica) - a sua sintonização e dessintonização - uma cine-gramática toska e romba usada como orientação karytativa.

Trata-se de um filme-artefakto que resulta de uma intervenção plástica "ao vivo", isto é: é um filme sem "pós-produção" - todos os "efeitos" do filme (a divisão do écran em quadros-bd) foram realizados durante a rodagem (filmando e refilmando por diferentes vezes o mesmo pedaço de película) ou então executados sobre a própria película ( no caso dos riscos e côres).

O rekurso a yntertítulos eskritos em português sohniko, uma synteze proto-kryoula & retroh-futurista da lyngua portugueza, dezenvolvida e reafinada ao retardador ao longo da últyma dékada do sékulo.

Edgar Pêra


O TRABALHO
O trabalho do Sr. Ego

Da ideia ao filme

Quando saí da Escola de Cinema tive um início desastroso: era um inadaptado e encerrei logo a actividade. Voltei à carga e descobri que gostava mais de «répérages» que de filmes. O que me interessava existia na realidade, não em histórias da carochinha. Não procuro uma equipa para filmar mas para atacar o terreno de rodagem. O filme é sempre encarado como um território de investigação. Sem investigação não há ficção. Numa ficção convencional recriam-se acontecimentos. Eu tento criá-los. As centenas de páginas do guião ficam na gaveta no momento de filmar: é o exame final, sem cábulas, não tenho um papel na mão e jogo de cabeça, ainda por cima com outros cromos da bola. E a investigação é isto: estar do lado da amiba, dizer não ao microscópio. Tento ir para o meio dos protozoários! O que mais me lixa é o National Geographic com aqueles tipos escondidos nos arbustos, à espera que o crocodilo mergulhe no lago.

Montagem

É o lado mais frankensteiniano do cinema, o que lhe dá vida. Organizo o caos sem uma «decoupage» pré-programada. Se ela existe, é a de um directo sobre uma manifestação que não sabe para onde vai. A planificação é feita a quente, passo a passo: estou à câmara e readapto-me ao que está a acontecer, sem desfasamento. Não há uma fórmula mágica nisto. O que tento levar para a montagem é o ritmo da rodagem. A minha montagem está entre a escrita normal e a surrealista: ando sempre a controlar o cadáver esquisito dos meus filmes.

Choque imagem-som
O computador é um elemento da redenção que me permitiu trabalhar. Gosto da agilidade e do pulsar do rato, de criar conflitos entre a imagem e o som, pôr o princípio no fim e o fim no meio, para ver o que dá, nem que seja só para testar a chapa. Quero descobrir se uma determinada imagem pode levar uma porrada com um som qualquer e resistir-lhe. Uso muito pouco som directo, e estas coisas só se podem digladiar na montagem. Se coloco um determinado som num segundo qualquer, posso acabar por retirar a imagem desse segundo. Mas isto tem de ser organizado, não pode ser uma coisa fundamentalista, não se pode cair num enorme barroquismo, senão é o «twin terror», o patinanço completo.»
Edgar Pêra


O Homem da Máquina de Filmar


Dá pelo título de "A Janela (Marialva Myx)" e é assim a modos de um "ovni" de cinema português que esta semana aterrou. O seu "autor" é Edgar Pêra que, apesar de um outro filme anteriormente estreado, "Manual de Evasão Lx94" , tem sido há mais de 10 anos uma espécie de presença fantasma no cinema português: de quando em quando, lá aparecia, em manifestações mais ou menos paralelas, um daqueles inclassificáveis produtos audiovisuais com as marcas distintivas da sua linha de montagem.

"Presença fantasma" como? A resposta está subentendida num pequeno deslize no enunciado acima, entre um artigo indefinido e um outro definido: "de cinema português" e "no cinema português". Diferentemente de um modo de produção dominante, cuja referência tem sido o apoio financeiro do Estado via Instituto Português de Cinema, Pêra foi mais ou menos continuadamente filmando, com a mobilidade permitida pelos novos meios técnicos. O seu cinema estava algures, certamente "português" nas suas inscrições sociais e culturais, mas reivindicando uma exterioridade, e mesmo emancipação.

Em parte por isso, ou melhor, talvez com isso, Pêra foi construindo uma "persona", com as marcas de assinatura dos "k", em vez dos "c", e dos "y", em vez do "i" escarrapachados nos genéricos, e dando por nomes como "homem-kâmara" ou "senhor ego". É assim a modos que o seu "folklore", mais ou menos confundindo-se com uma mitologia de marginalidade. A presente estreia de "A Janela", numa "operação Edgar Pêra" que também inclui dois programas com outros filmes seus, permite esclarecer várias coisas.

Dificilmente a aura de "marginalidade" se pode aplicar a um cineasta que foi nomeadamente continuando a sua actividade com sucessivos trabalhos de encomenda: "Manual de Evasão" (para Lisboa-94),"A Cidade de Cassiano" (em torno do arquitecto Cassiano Branco), "SWK4" (Almada Negreiros), "O Trabalho Liberta?" (para a cadeia de televisão Arte),"Lisboa-boa 345 dt" (Festival dos Oceanos), "25 de Abril Aventura Demokrátika" (Centro de Documentação 25 de Abril) - e Pêra ultima duas outras, um telefilme para a SIC e "O Homem-Teatro" (sobre António Pedro).

Esta sucessão, que no crivo da tal "marginalidade" o pode desqualificar, é no entanto indício do que é efectivamente importante: a reiterada disponibilidade para filmar e a construção de um modo de produção própria, numa atitude inédita no cinema português.

Se por acaso numa rua de Lisboa o leitor se cruzar com um transeunte com uma máquina de filmar, atenção que pode não ser um turista mas sim Edgar Pêra. É um tipo de labor representativo de um dos fenómenos mais importantes do cinema contemporâneo. Sobretudo com as câmaras de vídeo, há verdadeiros novos centauros, observadores e intervenientes numa realidade imediata, o corpo confundindo-se com uma câmara, radicalmente inscrevendo de modo novo o sujeito no próprio processo filmico .

O que no caso de Pêra se torna particularmente interessante é que esta postura não se compraz numa imanência do real. Pelo contrário, o seu modo distintivo é a sucessão de manipulações que opera num manancial de materiais heteróclitos ("A Janela", por exemplo, foi filmado em 35mm, super 8mm, video), designadamente por operações de montagem e de incrustação de "parasitas" na imagem.

A janela , sabe-se, é uma clássica metáfora do cinema, "janela aberta para o mundo". No caso, em "A Janela", Pêra filma efectivamente uma, aberta para o mundo que tem como microcosmos o lisboeta bairro da Bica - mundo portanto numa escala reduzida, tal como o modo de produção. Mas o olhar cinematográfico que rege este peculiar "mundo" é altamente formalista.

Pêra pode reivindicar para si o título do famoso filme de Dziga Vertov, e um dos grandes exemplos do formalismo russo-soviético, "O Homem da Câmara de Filmar" - ou "máquina de filmar", a noção da prótese maquinista do corpo humano sendo de rara pertinência. De resto, os modos como vai assinando os seus filmes, por exemplo como "filmado, dirigido e montado", Pêra assinala como o trabalho de "direcção" (de realização, de autoria), se baliza entre os actos de "filmar" (é ele próprio o seu "cameraman") e "montar" (idem).

É então interessante notar que estas dicotomias filmar/montar ou real/manipulado, se sucedem ao longo da obra noutras, como documentário/ficção ou local/global, como se pode constatar nesta "operação": note-se, por exemplo, a perseguição no topo do cinema Éden, o desejo de ficção que emerge no documentário sobre Cassiano, ou um persistente "topos" lisboeta em que irrompe um outro desejo, utópico, como em "Lisboa boa-boa 345dt".

"A Janela" atesta os limites do modo de produção que Pêra foi forjando - longa-metragem de ficção passando pelo subsídio público, só foi acabada com a intervenção de um produtor institucional (Paulo Branco). Também não deixa de patentear uma difícil gestão do tempo (embora felizmente não comparável ao exasperante "Manual de Evasão"). Mas sobre o desopilante folclore "kitsch" de António, marialva da Bica, e das suas muitas amantes, há um singular olhar de cineasta - ou será mais correcto dizer "homem-câmara"?»
.
Augusto M. Seabra, Público


ENTREVISTA AO REALIZADOR


'Antónyo, o turbo-tyger'
Edgar Pêra em entrevista, a propósito da estreia do seu novo filme, «A Janela (Maryalva Mix)»
Encontrámos o Sr. Ego, nome de guerra de Edgar Pêra, no momento em que os primeiros Tomahawks aliados atingiam Kabul. TV ligada, som cortado, é a guerra em directo que coloniza o mundo. No momento da estreia de A Janela (Maryalva Mix), melodrama «lusoh-galaktiko» de cortar à faca no Elevador da Bica, damos a palavra a este lisboeta que em Abril de 74, durante a adolescência, foi «mordido por uma revolução radioaktiva». Depois, estudos de Psicologia, Escola de Cinema, os primeiros filmes no fim dessa década.

Mais tarde, a reivindicação do português sónico como direito à diferença, as «encomendas» que foram A Cidade de Cassiano, SWK4, com textos de Almada Negreiros, Manual de Evasão, para a Lisboa 94, e mais recentemente 25 de Abril Aventura Demokratika. Para recapitular, há mais de 10 anos de trabalho de um realizador único no cinema português. Por isso, a Atalanta Filmes organizou uma «Operação Edgar Pêra», escolhida pelo próprio e dividida em dois programas, que serão exibidos no King, sempre à meia-noite, durante o fim-de-semana. Mas a «janela» está no centro: história dos amores entre Antónyo, alfacinha de gema, e as suas seis amantes, com a ameaça de um crime para completar o ramalhete. Para cada amante há um Antónyo novo: o xoramyngas (Nuno Melo), o anymal (Miguel Borges), o tanguysta (José Wallenstein), o sekretysta (Nuno Bizarro), o levezyto (João Didelet) e o santynho (Manuel João Vieira). As seis amantes são interpretadas por Lúcia Sigalho que acompanhou Edgar Pêra desde a origem deste projecto, em 1997. Na forja está também um trabalho sobre António Pedro e um telefilme da SIC. Kum Kacêt!

Quem é que está à janela? O Sr. Ego?
Sim e não. Também lá está o Antónyo. O filme flutua narrativamente entre o ponto de vista dele e o do olheiro. Primeira dúvida: aquele olho gigante é da personagem ou do autor? Até que ponto estará o Antónyo a fazer o filme? Os «textículos» que fazem pontos de passagem (escritos por Manuel Rodrigues) não querem dizer rigorosamente nada, são ideias para lançar a confusão. Acabas sempre por ser um grande tanguysta. Metes-te numa alhada e tens de te safar. Quando criámos a Akademya Lusoh-Galaktyca, um centro de investigação que já acabou, fomos para a Bica e apaixonámo-nos por aquela janela. Eu andava a escrever um projecto na desbunda: apanhava bocados de conversas e escrevia-os no computador. Depois comecei a criar personagens com a Lúcia, mas nem eu nem ela pensávamos fazer dali alguma coisa: era um terreno com imensos clichés. O argumento apareceu com essas experiências.

Há um porquê para a tua inadaptação à «coisa cinema»?
O que é um filme? Qualquer coisa projectada numa sala de cinema, não há outra definição. Um jogo da NBA numa sala de cinema é um filme. O cinema é um trabalho sobre o tempo que é projectado numa sala e tem uma certa duração. E quanto mais afunilas a definição menos hipóteses há para a surpresa. O que me interessa é a surpresa de quando o cinema surgiu. A partir do momento em que as pessoas deixaram de confundir o comboio do Lumière com o filme o cinema morreu. Detesto cinefilias, eu vou ao cinema quatro ou cinco vezes por ano. Há tantas coisas para fazer.

Análise romântica?
Claro, mas é uma análise, antes de tudo. Eu tomo outro partido quando dou a palavra ao Agostinho da Silva (O Trabalho Liberta?) ou ao McKenna (Manual de Evasão). Quando escolhes um termo, ou o deixas entre aspas e não o discutes ou vais atrás dele até perceberes que ele te destrói o sentido da frase. No meu trabalho, para descobrir que a verdade não está num sítio só, é preciso muito tempo de observação. Muitos testes ao material, como o Skip — vamos lá contar as lavagens. Mas eu só vejo os defeitos, estou sempre à espera que me contradigam.

Por aqueles que dizem que os teus filmes não vão para lado nenhum?
Isso é uma crítica pertinente que me agrada. Quando entrei no cinema arranjei logo problemas, a selva existe. Quanto a isso, o que não mata engorda. Não me venham com tretas: para onde vai a ficção? Para algum lado? Vai para o fim da história, e é tudo porreiro se quiseres passar ali um bom bocado, tens esse direito. Mas o que faz isso à tua vida? Eu não faço nenhum filme que ache que não tem influência sobre a vida das pessoas, mesmo que falhe redondamente. Não me ponho do lado do Bush nem do do Bin Laden, até porque acho que estão os dois no mesmo lado. Mesmo a desacreditar, a fazer de cada assunto uma espiral sem fim e sem conclusão, o facto de as ideias estarem nos meus filmes em poeira cósmica, a orbitar, pode fazer qualquer coisa explodir.

O trabalho no caos tem uma ordem. Como é que te organizas?
A ordem é militarizada, é uma questão de disciplina. A minha estratégia é esta: vamos para a guerra, um por todos e todos por um, tem de estar tudo a trabalhar para o mesmo. O contrário do que acontece numa produção normal. Se há uma pequena peça no grupo que falha, o trabalho fica todo em causa. Duvidar é para a altura do debate de ideias. Mas quando estás ali com a metralhadora não dá, é tudo muito rápido, não se pode falhar. E às vezes arranjo problemas com o gajo que não me disparou o gatilho. Se alguém pergunta porquê, acabou, já perdemos o comboio!

E é o que o Sr. Ego diz: dispara agora!
Ora bem: dispara e foge do homem-câmara!

Porque é que o teu filme é uma «missão antidogma 2000»?
É uma palhaçada em relação aos outros palhaços, que estão ao nível do cientista de Auschwitz. Mas prefiro que os dogmáticos escolham a arte em vez da política. Acho muito bem que os nazis só façam filmes e fiquem por aí. O «Big Brother» também deu uma imagem disso, as pessoas meteram-se lá dentro sem pensar no que estavam a fazer.

Vês o «Big Brother»?
Vi o primeiro.

E então?
Gramei! Houve ali verdadeiros momentos de estudo animal. Prefiro isso ao Lars von Trier. Quer dizer: acho que ele é um grande artista.

E a transmissão na TV da queda das Twin Towers? É um filme?
E que filmaço! É o «Big Brother» dos terroristas. Costumo dizer que A Janela é uma utopia maryalva muçulmana. Só de pensar nas virgens do paraíso que vêm para aí depois daqueles kamikazes todos... Se pensares bem, cada um daqueles tipos era um potencial Antónyo que encontrou o paraíso.

O Antónyo é muçulmano?
É, mas o Sr. Ego é americano. É um detective.
.
Francisco Ferreira, Expresso, 13/10/2001


DECLARAÇÕES DE LÚCIA SIGALHO

'Uma Xerazade pós-feminista'
Em 1996, anos antes de José Álvaro Morais e Teresa Villaverde descobrirem Lúcia Sigalho para o cinema (em Peixe-Lua e Água e Sal), Edgar Pêra convidava a actriz-encenadora a participar num projecto de documentário sobre o bairro lisboeta da Bica, com personagens de ficção. "A realidade real" entrava na sua zona criativa, ficou "com os sininhos todos a tocar". Deu ao cineasta a ideia das seis mulheres dum homem, que resultaria no filme A Janela (Maryalva Mix). Interessada "na questão da mudança compulsiva de personalidades", partiu para improvisações. "Toda a rodagem assentou nelas, as minhas e as dos outros actores", recorda.

Das suas nasceram as "seis mulheres e uma sereia" do Antónyo da Byka - bykudíssimo exemplar de polígamo multifacetado -, "mais a Marya de Fátyma, fadista castiça, mãe dele ou talvez não", adianta Lúcia Sigalho. Nesse desdobramento enquanto actriz, só vista! Contando, ninguém acredita... Ainda assim, acredite ou não, reproduzimos excertos duma entrevista onde, não só a génese da criação foi sendo contada, mas também era apresentada aquela galeria feminina, no estilo inimitável da directora-fundadora da companhia Sensurround.

Lúcia Sigalho atendeu-nos em plena azáfama de ensaios do seu próximo espectáculo no Armazém do Ferro: Viagem à Grécia, a partir da Antígona, de Sófocles, e de poemas de Sophia de Melo Breyner Andreson. Em veloz mudança de registo, como se imaginará, apresentou as suas personagens n'A Janela, "todas elas inspiradas em figuras lisboetas um bocadinho chapadas, cada uma com as suas coisas amalucadas, umas casadas com o Antónyo, outras não, mas todas a flasharem com ele de algum modo, a vigiarem-se e a comentarem-se". Por ordem de entrada no ecrã, ei-las, identificadas e por Lúcia imitadas en passant, com muita risota pelo meio.

Júlia, peixeira. "É uma mistura de tipos: tem imensas opiniões, do tipo bulldozer, sobre modernização do bairro; trabalha dia e noite, "pois o Antónyo, coitadinho, é artista, não pode trabalhar, ele não é capaz e então eu, pois, é claro, vou pagando aquilo que é preciso pagar, ele agora vai fazer um disco..."; vende na Ribeira, "mas agora o peixe já não é como antigamente e as freguesas já não são como dantes e vêm regatear o carapau, ora o carapau já não pode custar o que custava dantes, agora é uma coisa muito mais politicamente correcta, não é?""

Sara, artista conceptual. "É uma pós-ninfomaníaca, está à procura do corpo, essa coisa muito fin de siècle, de que os artistas conceptuais, os performativos e os audiovisuais andavam todos à procura. "O Antónyo tem um corpo, coisa que não é muito comum em Portugal!" Então, ela está nos ateliers de São Paulo, a pensar na arte e no raio que a parta, o Antónyo é assim mais "um objecto na mente", embora dessem umas voltas. Entre Nova Iorque, Tóquio e Xabregas, lá trata dos affaires."

Marya, espanhola. "É chalada. "Mi marido es cantante de fado, no trabaja, se canta el fado todas las noches hasta las seis de la mañana y yo tengo seis hijos, drogadictos. Y tengo dos amantes, claro. Quando me indispueso con Antónyo, hube una fiesta muy rica aqui en Bica y bailámos sevillanas todo el dia..."

Mirita, para-médica. "Muito feia, com bigode, muito infeliz e neurótica, é puritana mas o Antónyo deu-lhe umas voltas. Mãe solteira dum filho do Antónyo, que lhe dá maus tratos, com que sofre imenso. Mas é "porque ele não sabe tratar da vida dele, tem muitos problemas psico-somáticos. Há uma grande taxa de esquizofrénicos em Portugal e o Antónyo não sabe, mas o que ele tem é uma esquizofrenia latente..."

Jacqueline, africana. "Uma das mais divertidas, embora das que tiveram menor desenvolvimento. É "a zona libèrtada dà humànidadi e dà sexuàlidadi. Não tem problema, gosta do Antónyo, é àmiga deli, só àmiga: compreende-o, ele tem aqueles problemas culturais dos bráncos, as bráncas são muito possessivas, a Jacqueline não tá aí nem para compreender os problemas delas e o Antónyo, coitado, às vezes, precisa di descontraír...""

Marya de Fátyma, fadista. "É a chave da tragédia, não se percebe se mãe ou madrinha do Antónyo. Tem ciúmes mortais das outras todas, desanca nelas, acha que não prestam para nada. No resto do tempo, vai dizendo "mas eu sou fadista, canto o fado"."

Patrícia, antropóloga. "Anda a fazer um estudo, articulado com uma equipa em São Francisco e outra em Amsterdão, sobre as populações que vivem no meio: passam o tempo a ver passar comboios ou assim, zim-zim, zim-zim. Na Bica, é o elevador: anda abaixo e acima sem ir a lado nenhum. "Uma metáfora da portugalidade", para ela, que tira medidas às pessoas, dia e noite mede o Antónyo, exemplar sui generis."

Sereia. "Dá ao Tejo e aparece na Bica, a pedido do Manuel João Vieira. Não resisti e achei que fazia sentido aparecer como sereia, a fazer oink! oink!"»
.
Elisabete França, Diário de Notícias, 12/10/2001




(imagem deste vídeo em mau estado)
Realização: Edgar Pêra
Argumento: Lúcia Sigalho, Manuel João Vieira, Senhor Ego
Dir. Fotografia: Luís Branquinho
Montagem: Pedro A. Machado, Inês Henriques
Música: Artur Cyanetto, Tiago Lopes
Canções: Pedro Ayres Magalhães, Paulo Pedro Gonçalves
Interpretação: Nuno de Melo, José Wallenstein, Lúcia Sigalho, Manuel João Vieira, Jacqueline Ginja
Miguel Borges, João Didelet, Nuno Bizarro
Origem: Portugal
Duração: 104’

.

PEQUENAS MENTIRAS ENTRE AMIGOS - Francês, 1 cópia, 1 sala, 8 semanas em Lisboa. Diz tudo. Amores incondicionais.

Ainda é possível a admiração por alguns programadores de cinema em Lisboa quando, dentro de um centro comercial, ainda têm a ousadia de manter um filme em sala durante oito semanas.

Um filme francês com uma sala só para si ao fim deste tempo todo é um fenómeno raro mas não inexplicável.

É um filme cuja atracção cresce pelo boca a boca que vem revelando sempre grande satisfação à saída da sala. Um filme de público - como ocasionalmente temos oportunidade e obrigação de sublinhar que a França ainda faz regularmente - com a sugestão da revivência de felizes memórias de grupo.

Bastará dizer que o filme é uma variação sobre a forma de Os Amigos de Alex para contextualizar rapidamente o que se passa em cena, desta vez com uma geração francesa entre os 30 e os 40 anos.

São figuras a entrarem na crise de meia idade sem terem ainda superado a adolescência, um grupo por isso susceptível aos pequenos dramas e aos grandes erros como só o embalo psicanalítico moderno vai criando.

As suas preocupações são múltiplas mas a sua origem pode ser traçada ao egoísmo de cada um daqueles elemento. Os seus distúrbios tê, quase sempre, uma razão amorosa para a qual a sua idade exige uma atitude mais ponderada mas a sua mentalidade mantém irresolvida.


Os temas que o filme trata melhor de entre o conjunto de preocupações são aqueles que mal toca, falando deles através da atenção aos pormenores - das interacções, das solidões e das acções. Outros, talvez até mais sensíveis ou importantes, são tratados de forma pesada, assumindo um papel central mas não conseguindo promover o interesse do público.

A interrogação sexual da camaradagem tornada num amor que a sociedade não sabe exprimir senão através de preconceitos é um desses casos tratados sem sensibilidade; enquanto em sentido oposto o cansaço de uma mulher pelo seu papel da jovem sedutora incorrigível é quase uma miragem narrativa mas executado com uma exactidão maravilhosa.

Não será estranho que esse papel de mulher amadurecida resulte por estar entregue a Marion Cotillard, mas seria injusto não elogiar a totalidade do elenco que faz sobressair o humor que sustenta a espera pelos momentos catárticos que acabarão por chegar depois de duas semanas de coabitação - nada mais stressante para testar laços de amizade.

Mesmo sendo longo demais, sem desfecho inovador que redima a meia hora a mais que tem, o filme é um agradável encontro capaz de recriar a identificação com aquelas vidas bem mais do que Funeral à Chuva, a recente (e novelizada) versão portuguesa do mesmo esforço, conseguiu.

A entristecida nota final vai para a música. Sendo Os Amigos de Alex o mais lembrado filme destas reuniões de amigos, Les petits mouchoirs escusava de intensificar a memória comparativa ao filme de Kasdan através da sua banda sonora completamente americana, sem sequer um toque francês que sublinhe as quatro décadas que este grupo já vivera. A música é boa; não é particularmente apropriada.
.
Carlos Antunes, blog splitscreen


Guillaume Canet iniciou-se no cinema como actor, demonstrando de imediato todo o seu talento e se recordarmos filmes como "Feliz Natal" ou "O Caso Farewell", percebemos como ele veste as personagens que interpreta no cinema. Mas, como não podia deixar de ser, Guillaume Canet também se sentiu atraído pela realização, revelando também o seu enorme talento como argumentista e, em 1998, estreia-se na realização com a curta-metragem "Je Taim", para quatro anos depois se atirar a essa aventura de realizar uma longa-metragem, com "Mon Idole". "Ne Le Dis à Personne" foi o seu filme seguinte, realizado em 2005, mas será em 2010 que todos iremos fixar o seu nome como cineasta, ao realizar essa obra-prima intitulada "Pequenas Mentiras entre Amigos" / "Les Petits Mouchoirs", sem dúvida alguma um dos melhores filmes estreados em Portugal no ano de 2011.

"Pequenas Mentiras Entre Amigos" / "Les Petits Mouchoirs" é uma película que navega nesse território aberto por Lawrence Kasdan ao realizar "Os Amigos de Alex", que mais tarde teria o seu contraponto britânico em "Os Amigos de Peter", de Kenneth Brannagh. Mas, ao contrário destas duas excelentes películas, Guillaume Canet conseguiu ir mais longe cinematográficamente falando, ao utilizar o scope com um saber e um à vontade que nos deixa a todos a respirar cinema por todos os poros, ao mesmo tempo que nos oferece uma direcção de actores com a qual ficamos perfeitamente maravilhados e onde se destacam François Cluzet, Marion Cotillard, cada vez mais um nome a ter em conta no cinema mundial, Benoit Magimel e Gilles Lellouche, que já tinhamos visto recentemente em "Paris" e que aqui nos oferece uma das melhores interpretações da sua carreira, sendo desde já um nome a seguir com muita atenção.


"Pequenas Mentiras Entre Amigos" / "Les Petits Mouchoirs" é um dos mais belos filmes feitos até hoje sobre a amizade e Guillaume Canet revela-nos aqui todo o seu talento como cineasta, tornando-se um nome a seguir atentamente, ao mesmo tempo que nos oferece uma direcção de actores onde as interpretações são feitas à flor da pele, revelando os actores um mergulho perfeito no interior das personagens que interpretam. Estamos assim perante uma das obras-primas do cinema francês, deste novo século, que não deixa ninguém indiferente, porque aqui temos um dos mais belos retratos de uma geração.
.
Rui Luís Lima e Paula Nunes Lima, blog a memória do cinema




Título original: Les petits mouchoirs
Realização: Guillaume Canet
Argumento: Guillaume Canet
Fotografia : Christophe Offenstein
Interpretação: François Cluzet, Marion Cotillard e Benoît Magimel, Gilles Lellouche, Jean Dujardin, Laurent Lafitte, Valérie Bonneton
Origem: França
Ano: 2011
Duração: 154’

.

INAUGURAÇÃO DE EXPOSIÇÃO/FÁTIMA ROLO DUARTE NOS LIVROS EM CADEIA!



Fátima Rolo Duarte, sobre ela mesma: “Lisboa, 13 de Outubro, 1958 nasceu sem nome até lhe chamarem Fátima por culpa da Nossa Senhora. Rolo Duarte c'est le nom du père (em francês para ter duplos sentidos). Família de jornalistas, profissão que caiu em desuso e desgraça. Designer. Um livro publicado, um marido (jura), uma filha estudante de cinema. Até ver, expatriada em Bruxelas. Não respeita o actual presidente. Não gosta nada, nadinha do que andam a fazer a Portugal. Praia, pimentos assados. Fim.”

O título da sua palestra é “O filme da minha vida é o Johnny Guitar, mas a Agnès Varda é quem me põe a falar (muito).”

Apresentará um livro que ela própria trará para ofertar ao Cineclube de Faro: AGNÈS VARDA, LE CINÉMA ET AU-DELÀ.

Literário, ficcional, documental, poético, político, curtas-metragens, longas-metragens, a cores, a preto e branco, o cinema de Agnès Varda é daqueles que incita aos adjetivos e aos qualificativos, particularmente pela sua multiplicidade e complexidade. Desde 1954, com cerca de 40 filmes, a cineasta manifesta uma liberdade criadora que é testemunho de um percurso sempre inovador, de uma vontade de explorar o cinema em toda a sua riqueza e de o prolongar através das suas recentes instalações artísticas. Os seus filmes e as suas instalações apelam aos sentimentos dos protagonistas através dos quais ela nos convida a apreender universos diversos e variados, sejam eles de dramas ou dificuldades feitos.


projeto financiado por
.