O PRESIDENTE | 10 NOVEMBRO | ESCOLA SUPERIOR DE SAÚDE | 21H30



O PRESIDENTE
Mohsen Makhmalbaf
França/Georgia/Alemanha/Reino Unido, 2014, 115', M/14

FICHA TÉCNICA
 Título original: The President
Realização: Mohsen Makhmalbaf
Argumento: Mohsen Makhmalbaf, Marziyeh Meshkiny
Fotografia: Konstantine-Mindia Esadze
Montagem: Hana Makhmalbaf, Marziyeh Meshkiny
Interpretação: Misha  Gomiashvili; Dachi  Orvelashvili; Guja  Burduli; Ia  Sukhitashvili; Zura  Begalishvili; Lasha  Ramishvili
Origem: França/Georgia/Alemanha/Reino Unido
Ano: 2014
Duração: 115’





FESTIVAIS E PRÉMIOS
Chicago International Film Festival, 2014 - Vencedor " Golden Hugo " – Melhor Filme
15th TOKYO FILMeX International Film Festival - Vencedor Prémio Audiência – Melhor Filme
14th Beirut International Film Festival - Vencedor "Société Générale Award" Melhor Filme
 Venice International Film Festival - Filme de Abertura | Nomeado – Melhor Filme
International Film Festival Of India (Goa), - Filme de Abertura
Tbilisi International Film Festival, Georgia - Filme de Abertura
Tertio Millennio Film Festival - Filme de Abertura

Outras Presenças
Busan International Film Festival, 2014
London Film Festival, 2014
Warsaw International Film Festival, 2014
Carthage International Film Festival, 2014



CRÍTICAS
Mohsen Makhmalbaf é uma das mais persistentes vozes da luta contra a ditadura iraniana. Ele próprio foi preso e torturado pela polícia política na sua juventude, com sequelas graves sobretudo nos pés, só recuperando a marcha após várias operações. Já no exílio manteve-se empenhado na luta contra os excessos do regime e na denúncia das constantes violações dos direitos humanos no país, não só através do seu cinema como também da sua extensa obra literária. O contexto pessoal ajuda a entender melhor este O Presidente, filme de 2014 que só agora se estreia em Portugal. Até porque a perspicácia do ativista está numa visão mais global, inteligente e eficaz que não se fica por breves impressões do curto prazo. Se podemos identificar Makhmalbaf com um dos estropiados que no final regressam a casa, a sua verdadeira voz será aquela que se levanta contra a vingança desmiolada e primária, afirmando que violência gera violência. Uma perspetiva difícil, mas necessária, reforçada pela autoridade de quem sofreu a ditadura na pele.
Contudo não nos deixemos confundir. O Presidente não é uma alegoria direta à ditadura iraniana, mas antes uma metáfora sobre os regimes ditatoriais em geral, particularmente os do Médio Oriente. Mas não só. Facilmente se encontram possíveis inspirações noutras ditaduras: a própria fuga do Presidente tanto faz lembrar Kadafi na Líbia, como a surreal escapada de Ceausescu através da Roménia. Por outro lado, apesar de ser um filme denúncia, não é um filme que envolva um perigo semelhante aos realizados por Jafar Panahi ou Mohammad Rasoulofd no próprio Irão. E as ameaças à vida de Makhmalbaf parecem menos intensas com o recente entendimento entre o Irão e os Estados Unidos.
[...] está construído num registo de fábula, em que convivem imagens poderosas com outras redundantes. Logo de início, a introdução das personagens é forte, no pré-genérico, revelando um ditador que resiste aos caprichos do neto (numa conversa trivial - não lhe deixa comer um gelado), enquanto assina a condenação à morte de prisioneiros políticos (incluindo um rapaz de 16 anos). E avança de seguida, com forte capacidade semiótica, para uma demonstração de poder: faz ligar e desligar as luzes da cidade (uma brincadeira com o neto), até ao dia em que as luzes não se voltam a acender.
O que torna a caracterização da personagem superior é a descrença no mal absoluto. Este horrendo ditador é humanizado através da relação terna que estabelece com o neto. Um avô empenhado, capaz de dar a vida
pela criança. O homem cruel amacia-se ao longo da fuga e à medida que se confunde com o povo. Uma viagem dura e complexa, em que os fatores externos influenciam o interior, que chega ao seu cume quando, numa imagem cristã, o presidente lava as feridas dos pés de um ex-prisioneiro político. É aqui que, talvez ingenuamente, Makhmalbaf revela acreditar na redenção. Como a personagem diz: "Deixem a democracia encarregar-se dele". Até porque, ao exemplo das Primaveras Árabes, o mundo da pós-revolução que encontramos com a fuga do presidente repete os caminhos de violência do anterior: é um mundo cruel e indigno, com execuções espontâneas, à mercê do banditismo, em que não há respeito pela vida humana. Só travando o ciclo de violência é que se pode aspirar a construção de um país. Que a vida imite o cinema.
Manuel Halpern, visao.sapo.pt


O novo filme do iraniano Mohsen Makhmalbaf é dedicado aos sírios mas começou a ser escrito há nove anos. É sobre a ilusão do poder, sobre o “agora” e o “futuro”, sobre o bem e o mal que somos.
O Presidente que já não o é percorre o país que julgava seu disfarçado de músico de rua, com o neto e herdeiro a fingir-se menina. O Presidente leva às costas um preso político e finge que também ele passou pelos calabouços. O preso que vai às suas costas não pode pousar os pés no chão, a tortura foi muita mas pior teria sido se o tivessem descoberto: ao contrário de todos os camaradas, escapou à execução por ter assassinado o filho e a nora do Presidente, os pais do neto que agora finge ser Maria, a das aulas de dança, de quem nunca deixará de ter saudades, e que já não pode chamar ao Presidente o que sempre foi ensinado a chamar-lhe.
“O que é tortura?”, pergunta o menino. O Presidente quer largar o preso que carrega às costas e matar o homem que lhe matou o filho com as mãos, mas não pode fazê-lo. Pode, mas não o faz. Já não é o Presidente, já cantou, bebeu e fumou com todos aqueles homens que mandou para a prisão sem nunca hesitar, por mais novos que fossem, por mais inocentes, decentes ou honrados compatriotas que fossem. O Presidente já é um deles, mesmo que não o saiba.
O Presidente é o último filme do realizador iraniano Mohsen Makhmalbaf, há muito tempo a viver no exílio. Aos 58 anos, já foi tudo e o seu contrário. Tinha 15 quando criou o seu próprio grupo de guerrilha para derrubar o Xá Reza Pahlavi. Preso aos 17 anos por tentar esfaquear um soldado, saiu da cadeia cinco anos depois, durante a Revolução Islâmica de 1979, quando o Xá fugiu do Irão.
O novo regime dos ayatollahs tentou – e, até certo ponto, conseguiu – criar um cinema ideológico, islamista, e Makhmalbaf chegou a ser um símbolo desse cinema. Depois afastou-se, de novo na oposição, e tornou-se a prova do fracasso da tentativa dos islamistas para matar o cinema, o cinema que é mesmo cinema, aquele que reflecte o Irão e faz do Irão o que o Irão é. De “realizador do regime” passou a dissidente e foi porta-voz no exílio de Mir Hussein
Mousavi, candidato da oposição derrotado nas eleições fraudulentas de 2009, que deram a reeleição a Mahmoud Ahmadinejad e provocaram o chamado Movimento Verde, um dos precursores das revoltas árabes.

O Presidente é fruto destes últimos anos, turbulentos. “Começámos a trabalhar no guião há nove anos. Depois aconteceu o movimento em 2009 e reescrevemos tudo. A seguir vieram as Primaveras Árabes, e voltámos à escrita. Tentámos que funcione como uma metáfora do agora e do futuro, dos sistemas da ditadura e da revolução, que são sempre iguais. Presidente ou rei, xá ouayatollah, revolução, golpe de Estado. O Presidente podia ser Saddam Hussein, [o ayatollah Ali] Khamenei [Guia Supremo iraniano], Muammar Khadaffi, Estaline… Este não é um filme iraniano, é universal.”Medo do povo
Makhmalbaf viaja muito e calhou ao Ípsilon entrevistá-lo por telefone quando já passava da 1h no hotel russo onde estava hospedado, perto da fronteira com a China, nove horas de diferença. Estava acordado mas ensonado, cansado mas disponível. Respondeu a tudo e demorou-se nas respostas. O recepcionista é que não ajudou, sem grande vontade de atender a chamada.
Sofia Lorena, publico.pt

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